Numa época em que as coisas não eram descartáveis, existia na cidade dela uma oficina de brinquedos. Toda vez que um deles quebrava, bastava ligar pro hospital e um doutor de guarda-pó branco ia buscar o paciente, diminuindo a inquietação dos pequenos.
Ela não era especialmente cuidadosa com as filhas, costumava carregar as bonecas pelo braço, o que levantava sérias dúvidas quanto ao seu instinto materno. Mas uma coisa lhe tirava o sossego: quando os olhinhos delas insistiam em ficar fechados, mesmo quando estavam de pé. Não dava pra brincar que era dia, porque a boneca sempre dormia. Nesse caso, o único jeito era apelar pro hospital de bonecas, que era como ela costumava chamar a oficina.
As vezes parece que os olhos da alma dela estão avariados, com os mesmos sintomas dos das bonecas - sempre fechados, no máximo semi-abertos. Nessas horas, ela não consegue ver com clareza, e a incerteza a deixa esquiva e desconfiada. Assim, cerra as janelas e tranca as portas, deixando algumas vezes o coração do lado de fora.
Hoje em dia não existe mais o hospital e ela sente falta da segurança das certezas daquele tempo.
Imagem: http://www.putacore.zine.vilabol.uol.com.br/boneca.jpg
1 comentários:
amei o blog xD
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